A ideia de colorir superfícies vem desde a constatação de obras rupestres, sendo uma das expressões artísticas mais antigas. Mas no Brasil, no ano de 1954, a pintura ficou em preto e branco.
Um grupo de artistas brasileiros realizou um evento em preto-branco, o III Salão Nacional de Arte Moderna, que ficou conhecido como o “Salão Preto e Branco”. O evento na verdade foi uma forma de protesto contra a má qualidade das tintas nacionais. Neste evento os artistas expuseram só obras em preto e branco, com objetivo de reivindicar acesso a tintas de uso artístico de qualidade. Embora já existisse um fornecedor de tintas artísticas no Brasil (CORFIX, desde 1943) sua qualidade era questionável devido à mudança de coloração após sua aplicação.
Na época as tintas artísticas de procedência inglesa, francesa (no mercado desde o final do século XIX) e italiana (desde o início do século XX) eram os materiais que atendiam as necessidades dos artistas, mas o momento politico-econômico no Brasil não facilitava a aquisição desses materiais artísticos. Por decreto governamental esses materiais, que incluíam até revistas especializadas em artes, se enquadravam como produtos não-essenciais, juntamente com materiais de luxo, bebidas destiladas, e outros bens supérfluos, e tinham alto custo devido às taxas excessivas em sua importação.
Participaram do III Salão Nacional de Arte Moderna 108 artistas na categoria Pintura, um numero significativamente bem maior quando comparado aos 59 artistas inscritos na categoria Desenho e Artes Gráficas, cujas obras poderiam ter maior adesão, uma vez que o requisito preto e branco atuava como um facilitador.
As manchetes dos jornais na época divulgavam o evento como o “Salão do Protesto”. Artistas como Iberê Camargo, Djanira e Milton Dacosta lideraram sua organização que foi sediado no edifício do Ministério da Educação e Cultura, no período de 15 de maio a 30 de junho de 1954 no Rio de Janeiro.
O texto original sem autoria, transcrito por Glória Ferreira (1985), mostra como foi publicada a chamada para o evento: “Nós artistas plásticos abaixo-assinados, apresentaremos no próximo Salão Nacional de Arte moderna, a se realizar de 15 de maio a 30 de junho deste ano, os nossos trabalhos executados exclusivamente em branco e preto. Esta atitude será veemente protesto contra a determinação do governo em manter proibitiva a importação de tintas estrangeiras, materiais de gravura e de escultura, papéis e demais acessórios essenciais ao trabalho artístico; proibição esta que consideramos um grave atentado contra a vida profissional do artista e contra os altos interesses do patrimônio artístico nacional”.
Mesmo só com pinturas em preto e branco o polêmico salão foi um sucesso artístico e ao mesmo tempo também político pela conquista, embora parcial, dos artistas diante da decisão do governo de considerar a “importação dos materiais de arte como necessária, mas não prioritária“.
Um aspecto que ainda não teve amplo sucesso no campo das artes é o gasto associado a obtenção de materiais artísticos importados, que podem ter custos ate 10 vezes maior de seu equivalente nacional.
Fontes:
Imagem de Capa: Adaptado de Artout, disponível em: https://bit.ly/3sBZTNV
Salão Nacional de Arte Moderna – Enciclopédia Itaú Cultural
RODRIGUES, Glauco. In: FERREIRA, Glória; HERKENHOFF, Paulo. A arte e seus materiais;
Salão Preto e Branco: III Salão Nacional de Arte Moderna, 1954. Rio de Janeiro: